HISTÓRIA
Cultos Afro-Brasileiros
Uma geografia e uma história dos cultos africanos no Brasil representa
problema extremamente complexo, devido às origens diversificadas
e ao sincretismo, primeiro entre os vários grupos de escravos, depois
dos deuses africanos com os santos católicos, para fugir à perseguição
imposta pelos senhores. E mais modernamente, com o espiritismo.
O I Congresso Afro-Brasileiro, realizado em Recife em 1934 por iniciativa
de Gilberto Freire, permitiu um primeiro levantamento sistematizado
da influência negra no Brasil. Em vista das origens diversas dos
escravos e do sincretismo entre os próprios grupos negros que aqui
se formaram, sempre foi tarefa muito complexa uma geografia e uma
sociografia dos cultos afro-brasileiros. Esse problema cresceu ainda
mais com a disseminação desses cultos nos grandes centros urbanos,
o que propiciou o aparecimento de novas formas de sincretismo, também
com o espiritismo kardecista.
Em 1941 realizou-se no Rio de Janeiro o I Congresso de Espiritismo
de Umbanda. A partir de 1950, acelerou-se o crescimento do número
de adeptos e de terreiros dos cultos afro-brasileiros. A Congregação
Espírita Umbandista do Brasil (1950), a União Nacional de Cultos
Afro-Brasileiros (1952) e outras instituições nacionais e regionais
coordenam e defendem os interesses de seus fiéis. Inicialmente restritos
aos escravos e seus descendentes, os cultos afro-brasileiros, especialmente
a umbanda, ganharam adeptos da classe média urbana.
O candomblé das diversas "nações" africanas é a religião afro-brasileira
que mais fielmente preserva as tradições dos antepassados e a menos
permeável às transformações sincréticas, embora cultue secundariamente
entidades assimiladas, como os caboclos e os pretos velhos. Predomina
na Bahia e tem muitos seguidores no Rio de Janeiro. A umbanda é
francamente sincrética com o cristianismo e o espiritismo kardecista.
Os subúrbios do Rio de Janeiro possuem grande quantidade de terreiros
ou barracões de umbanda. O culto afro-brasileiro toma o nome de
pajelança na Amazônia, babacuê no Pará, tambor-de-mina no Maranhão,
xangô em Alagoas, Pernambuco e Paraíba e batuque no Rio Grande do
Sul.
Umbanda
Religião sincrética própria do estado do Rio de Janeiro, a umbanda
é praticada em terreiros encabeçados por um pai ou mãe-de-santo,
que preside às cerimônias, auxiliado por um cambono (acólito). Os
cânticos denominam-se pontos e, como no candomblé, têm a função
de chamar o santo, que se incorpora nos filhos-de-santo, ou cavalos.
Correspondentes às nações do candomblé, as linhas de umbanda são
diversas: linha do Congo, linha do Cabinda, linha da Costa. Como
no candomblé, os orixás se comunicam diretamente com as pessoas
em poucas oportunidades; preferem fazê-lo por intermédio de entidades
intermediárias, os pretos velhos.
Candomblé
Paradigma dos cultos de origem africana em todo o país, o ritual
do candomblé pode ser considerado, do ponto de vista musical, um
oratório dançado. Cada entidade -- orixá, exu ou erê -- tem suas
cantigas e suas danças específicas. O canto é puxado, em solo, pelo
pai ou mãe-de-santo e é seguido por um coro em uníssono, formado
pelos filhos-de-santo. Nas melodias mais antigas a escala é pentatônica.
Não há funções tonais nem cadenciais, acordes dissonantes ou artificiais.
Da cerimônia participam três instrumentos básicos: os atabaques,
o agogô e o piano-de-cuia (aguê); a estes se acrescentam um adjá
(no candomblé das nações do grupo jeje-nagô) e um caxixi (nos ritos
do grupo angola-congo).
Tal como se encontra na Bahia, esse candomblé, que pode ser considerado
mais ou menos ortodoxo, na realidade já se apresenta como um resumo
de várias religiões trazidas pelos negros da África e incorpora
ainda elementos ameríndios, do catolicismo popular e do espiritismo.
Xangô
Ainda que com características próprias, o xangô é a versão local,
em Pernambuco, Paraíba e Alagoas, do candomblé baiano. Xangô é também
a denominação, em língua africana, do orixá jeje-nagô das tempestades,
raios e trovões, cultuados em vários estados do Brasil. O ritmo
do xangô é fortemente marcado por instrumentos percussivos. A dança
se caracteriza pelo aspecto guerreiro, com os braços em ângulo reto
e as mãos viradas para cima.
Tambor-de-mina
Manifestação própria do Maranhão, cuja procedência é o ritual angola-congo
do candomblé, mesclado a outras sobrevivências litúrgicas, o tambor-de-mina
ou tambor-de-crioulo caracteriza-se por uma série de cantos acompanhados
por três tambores, uma cabaça e um triângulo de ferro.
Candomblé-de-caboclo
Manifestação própria da cidade de Salvador e municípios vizinhos,
na Bahia, o candomblé-de-caboclo é uma espécie de candomblé nacionalizado,
que toma por base a ortodoxia do candomblé jeje-nagô. Trata-se de
exemplo nítido do sincretismo religioso popular no Brasil. Registram-se
nele influências indígenas e mestiças, resumindo-se os hinos especiais
de cada encantado ou caboclo, cantados em português, a uma declaração
de seus poderes sobrenaturais.
Babaçuê
Versão local, em Belém PA, do rito jeje-nagô do candomblé baiano,
o babaçuê se assemelha em muitos pontos ao candomblé-de-caboclo.
Canta-se e dança-se ao ritmo de três abadãs (tambores), um xequeré
(cabaça) e um xeque (chocalho de folha-de-flandres). Os hinos denominam-se
doutrinas e podem ser cantados em língua africana ou em português,
segundo os espíritos com que se relacionam. Uma variedade desse
rito, o batuque, tem suplantado o babaçuê nos dias atuais.
Pajelança
No caso da pajelança (Amazonas, Pará, Piauí, Maranhão), o elemento
gerador é genuinamente ameríndio. As curas são levadas a efeito
pelos pajés, verdadeiros xamãs indígenas. O instrumento básico de
pajelança é o maracá, instrumento sagrado do pajé. As cerimônias
acompanham-se sempre de cantos e danças para divertir os espíritos.
Os cantos são melodias folclóricas conhecidas; as danças, exercícios
mímicos, com rugidos e uivos imitativos dos animais invocados. Há
inúmeras diferenças rituais entre uma pajelança e outra, sendo mais
característica entre as rurais a pureza dos traços ameríndios, enquanto
nas urbanas se registra uma mescla de elementos afróides, do catimbó,
do espiritismo e do baixo catolicismo.
Uma versão da pajelança amazônica é a encanteria ou encantaria piauiense,
fortemente aculturada com o catolicismo popular. Na encantaria,
os crentes repetem várias vezes certa quadra rogatória de purificação,
após o que o pai-de-santo dança em volta da guna (forquilha central
da sala), no centro de um círculo formado por todos os dançantes,
que giram sobre si mesmos da direita para a esquerda, em torno do
mestre, que entoa cantos (aié) para que algum moço (espírito) se
aposse de seu aparelho (filho ou filha-de- santo) e cante sua doutrina,
dançando em transe.
Catimbó
A origem do catimbó, cuja prática pode ser encontrada em todo o
Nordeste, parece ser a magia branca européia, chegada via Portugal,
aculturada com elementos negros, ameríndios, do espiritismo e do
baixo catolicismo. Nele se registram cantos de linhas, mas sem nenhum
instrumento musical nem bailado votivo.
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